E minha vida devia ser um filme...

Quem é o roteirista da história da minha vida?
Esse cara é bem louco, sabiam?
Ele muda tudo de uma hora pra outra, nada faz sentido.
E os atores coadjuvantes então? Loucura, fazem cada bizarrice... Os figurantes são muito engraçados, e eu, o ator principal, sou o mais atrapalhado de todos. Não sei se ele está escrevendo uma comédia, mas eu me racho de rir com cade cena nova que ele escreve. Ontem mesmo ele escreveu uma cena onde me dava um surto de escritor. Na roteiro eu saía correndo desesperadamente atrás de uma caneta. Achei uma em uma exposição, cuidadosamente arranquei a caneta do barbante que a ligava ao livro de recados e botei sorrateiramente no bolso. Logo em seguida começou uma fuga alucinante em direção ao Santa Ifigênia, um boteco que ficava a algumas quadras dali, na Praça da República em São Paulo. Para disfarçar meu crime pedi um risole de queijo. Eu sentei, mas as evidências do crime eram cada vez maiores e minha consciência pesava. Eu olhava para os lados e via que tinha um rapaz me olhando... talvez ele tivesse me seguido. O rapaz começou a chegar perto, e eu tentava disfraçar. Elem vinha se aproximando cada vez mais com aquele ar de dúvida na expressão. Até que ele chegou à minha mesa, colocou a mão no bolso como quem vai tirar um revólver e olhando no fundo dos meus olhos disse: - quer beber algo senhor?
Meu coração disparou, achei que ele estivesse apenas querendo desviar minha atenção. Com medo eu disse: - não, obrigado, só o risole me basta.
Assim que ele virou as costas eu saí disparado em direção ao Teatro de Arena, vi um banner de uma peça que falava sobre a censura na época da ditadura e não pensei duas vezes, entrei alucinadamente no teatro e fiquei ali disfarçado entre as dezenas de espectadores. Eu e minha ância, minha ira, minha consciência pesada. Não aguentando mais a pressão psicológica da situação na qual eu me via inserido resolvi ir ao banheiro e lá escarrei todos meus sentimentos inundados e empoçados dentro do meu coração como um dragão que cospe fogo em quem tenta se aproximar. Meu corpo enfraqueceu e o roteirista me fez sentar no chão do banheiro. Fracamente fez eu me arrastar até o papel higiênico. Peguei uns 30 centímetros aquele rolo de papel úmido e pus-me a escrever ali no chão. Finalmente eu entendera o motivo de eu ter roubado a caneta. Era caso de vida ou morte. Se eu não escrevesse o que eu sentia naquele momento, meus pensamentos tomariam conta de mim e o final dessa história poderia ser muito mais trágico caros leitores. Escrevi cada centímetro daquele pedaço de papel e vendo que aquela ância não passava resolvi pegar o rolo todo..... foram 40 metros de dejetos de sentimentos destroçados, sujos e rejeitados pelo roteirista. Nós, atores principais, somos os que mais sofremos, podem reparar que todos os problemas se voltam para nós, todos no filme tem uma relação conosco, se uma tragédia vai acontecer, nós, os protagonistas, estaremos sempre lá. Nossos amores sempre são os mais injustos e sempre choramos por não sabermos o que fazer. Mas sabem o que me deixa mais feliz com os roteiristas? Eles são sem criatividade e todos usam a mesma fórmula batida, msa que vocês, espectadores, gostam de ver: o mocinho, eu, sempre se dá bem no final.
Obrigado senhor roteirista. Amanhã nos vemos no próximo episódia da minha vida.